O cálculo do valor RMS surgiu da dificuldade de se medirem os valores de uma tensão ou corrente senoidal pois, estes variam o tempo todo, então, a ideia seria fazer uma média destes valores.
Entretanto, como temos um semiciclo positivo e outro negativo, um simples média aritmética daria zero como resultado.
Deixemos, por alguns instantes, a matemática de lado e pensemos “fisicamente” como conseguir expressar o valor de uma tensão ou corrente que varia deste zero a um valor máximo, retorna a zero, ora positivamente ora negativamente.
Se aplicarmos uma tensão em um resistor, seja ela continua ou alternada, teremos uma corrente no resistor, que podemos calcular com a Lei de Ohm, e como consequência desta corrente o resistor esquentará, ou seja, produzirá uma energia térmica pelo efeito Joule.
Antes de prosseguir é preciso enfatizar que existe uma diferença entre energia, seja ela térmica ou mecânica, e potência, que é o que nos interessa calcular aqui.
A energia, no nosso caso, elétrica é expressa em Wh (watt-hora) ou kWh (quilo watt-hora) é o que pagamos à concessionária na “conta de luz”. Outro “erro”, não é “conta de luz” e sim, conta de energia elétrica.
Esse “erro” deve ter vindo, provavelmente, dos primórdios do fornecimento de energia elétrica quando ela só servia para acender a lâmpada elétrica em substituição da vela e do lampião.
Mas, aqui estamos interessados na potência que cuja unidade é o watt e pode ser calculada por R x I2 ou E2 ÷ R.
Observe um detalhe nas “fórmulas” para calcular a potência dissipada em um resistor, em ambas, temos a grandeza elétrica, corrente ou tensão, elevada ao quadrado. Isso vai ser importante mais à frente.
Se a tensão, aplicada ao resistor, for “contínua” (não gosto deste termo, o mais correto seria dizer tensão constante), a potência instantânea se confundirá com a potência média.
Entretanto, se a tensão for alternada, a potência instantânea e a potência média terão valores diferentes e é aqui que vai entrar o conceito do valor de tensão e corrente RMS.
Não há nenhum interesse prático em se calcular a potência instantânea, no caso de tensões e correntes alternadas, por isso “inventaram” os valores de tensão e corrente RMS que nos permitirão calcular a potência média.
A eletrificação das cidades surgiram em corrente contínua. A corrente alternada veio depois. Sabia-se que havia uma equivalência de trabalho produzido (notadamente em forma de calor) pela corrente contínua e pela corrente alternada senoidal. Então, criou-se uma correspondência entre valor de tensão contínua e o valor de tensão alternada eficaz, de modo que a tensão de trabalho uma mesma lâmpada pudesse ser utilizada em ambas redes elétricas.
O termo “RMS” emergiu nos tempos do áudio, como um recurso de “defesa do consumidor” , quando alguém percebeu que um amplificador de áudio tem seu limite de ceifamento do pico de onda (clipping distortion) é maior quando, em vez de reproduzir (por exemplo) um som contínuo de uma sirene de alarme de incêndio, reproduzisse um som de curta duração, como o de uma batida num bumbo.
Quando o amplificador está em silêncio ou processando sinais de pequena intensidade , a tensão dos capacitores da fonte de alimentação atingem seu valor máximo.
Quando o amplificador processa um sinal de grande intensidade, porém de curta duração, há pouca queda de tensão nos mesmos capacitores . Mas, quando o amplificador processa um sinal de grande intensidade e longa duração, ocorre uma queda de tensão considerável nesses capacitores, tanto pelo consumo da reserva de carga dos mesmos, como pela própria queda de tensão do secundário do transformador que alimenta a fonte, em função do limite de regulação de tensão, decorrente de vários fatores que introduzem uma “resistência elétrica interna” nesse componente.
Lógico, como a potência que um amplificador tem sua potência atrelada a tensão de alimentação, estavam abertas as portas do inferno para os trapaceiros de plantão.
O Instituto de Alta Fidelidade (IHF), vinculado ao IEEE – Instituto de Engenheiros Elétricos e Eletrônicos dos EUA, publicou uma forma de medição aparentemente “civilizada” para quantificar essa propriedade intrínseca de variação de potência instantânea dos amplificadores de áudio.
Adotou-se um sinal padrão de teste repetitivo de 1 kHz, no qual a amplitude permanecia baixa a maior parte do tempo e máxima durante um curto período de tempo. O objetivo era poder declarar quantos decibéis um amplificador poderia ultrapassar o limite de ceifamento em regime de potência média contínua quando processava o sinal padrão sugerido.
O termo dessa medição ficou conhecido “Dynamic Headroom”. “Headroom” é um termo de engenharia civil; trata-se do espaço de reserva que há entre a altura de uma pessoa e o teto de uma sala. Quanto maior essa distância, menor o risco do morador bater a cabeça no teto, principalmente se resolver dar um pulo no meio da sala…
O “Dynamic Headroon” era declarado como a relação do trabalho elétrico instantâneo e o trabalho elétrico de prazo indefinido, a ser expresso em decibéis. Esse foi “ovo” da serpente, pois se fez uma relação de duas grandezas elétricas não exatamente iguais!
Estava aberta a temporada da caça.
Como quase ninguém sabia o significado da medida, os fabricantes trocaram o termo de “ganho de decibéis” obtido no método IHF em “potência musical instantânea”, declarada em watts. Em função do apelo comercial, o valor de potência média contínua foi propositadamente “esquecido'”.
Não bastasse isso, começou uma louca inflação no valor de potência declarado, ao utilizar-se os mais bizarros métodos de “medição elétrica da potência instantânea”. Um deles considerava o limite teórico da energia armazenada no banco de capacitores do amplificador de saída, sem considerar as perdas de rendimento dos transistores e outros componentes. Era como se um amplificador de áudio se transformasse numa fonte para lâmpadas de flash fotográficos!
Não tardou e os consumidores acordaram para o problema. O termo “RMS” , apesar de erroneamente definido, tornou-se a referência segura para escolha de um equipamento de som adequado. RMS, um mal menor…
Caro Jonas,
Muito obrigado por enriquecer o artigo com sua contribuição.
Cheguei a pensar em mencionar o IHF mas, iria esticar muito a “conversar” e sair do foco principal. Suas observações ajudaram, certamente, ao leitor mais interessado no tema e com vontade de “aprender sempre”, como costumo dizer.
Existem coisas que me incomodam como, por exemplo, ver unidades de medidas grafadas erroneamente, principalmente, em comercias. Chega a me doer na alma ver escrito ou falado, “gigas” para dizer que estão lhe “dando” não sei quanto gigabytes a mais “sem cobrar nada”.
Alguém deveria informar ao marqueteiro, que múltiplos e submúltiplos de unidades não têm plural. Tudo bem, uma “pessoa comum” chegar no supermercado e pedir duzentas gramas de queijo!
Não serei tão purista quando alguém me perguntar meu “peso” eu responder: “depende de em qual planeta eu estiver”, aqui na Terra, que não é plana, considerando a gravidade como 10m/s2, 80quilogramas!
Enfim ente escolher os “watt RMS e PMPO, como você disse, um mal menor…
Abraços e até sempre!
Obrigado, Paulo!
Por um triz, o Brasil quase publicou um método “padronizado” sugerido pelo COBEI – Comitê Brasileiro de Eletrotécnica para medição da PMPO.
Embora em bases mais ou menos semelhantes ao método IHF, o método de medição proposto pelo COBEI não agradou aos marqueteiros mais afoitos.
O projeto foi embargado pela própria ABNT que não deu aval à iniciativa. Esse Organismo Normativo, vinculado ao Inmetro, sugeriu aos membros do COBEI que “continuassem a estudar e debater melhor sobre o assunto”.
Sorte dos engenheiros brasileiros, por não ter de passar por uma vergonha de amplitude global.